Viabilidade de Compras em Outros Estados na Construção Civil.

Comprar materiais ou insumos em outros estados
rede de negócios

Já trouxemos em outros posts que a função do comprador vai além da simples compra de materiais e contratação de serviços. E aqui um ponto importante é sobre entender de questões tributárias e fiscais que podem surpreender o canteiro de uma forma positiva ou negativa, dependendo do nível de consciência do comprador na hora de tomar decisões relacionadas a tributação de produtos, equipamentos e até mesmo na contratação dos empreiteiros.

Realizar aquisições de materiais em diferentes estados pode ser uma estratégia complexa e, ao mesmo tempo, vantajosa para empresas do setor da construção, especialmente quando se busca diretamente os fabricantes. Este cenário exige uma compreensão sólida de princípios contábeis, uma vez que a equação não se resume apenas ao custo dos insumos, mas inclui fatores cruciais como o frete, a emissão de notas fiscais e, sobretudo, os impostos.

Ao longo de minha carreira, atuei como comprador em construtoras envolvidas em obras em diferentes estados ou que necessitavam adquirir materiais de fornecedores localizados em outras regiões. Por exemplo, a construtora onde trabalhei era sediada em São Paulo, a obra também, porém, a fábrica de pisos encontrava-se em Camaçari, na Bahia.

Embora os preços dos insumos diretos do fabricante, especialmente quando comprados em grandes volumes, geralmente sejam mais atrativos do que os oferecidos por distribuidores e lojas locais, dois desafios primordiais sempre permearam essas transações: o custo do frete, a emissão de notas fiscais e, mais crucial, a complexidade tributária.” Diz Daniel Furtado – Head de Engenharia na ConstruConnect

Por isso, hoje, vamos compartilhar conhecimentos básicos de contabilidade sobre os principais impostos incidentes nesse cenário, os quais podem impactar significativamente suas decisões de compra junto aos fabricantes.

Impostos Incidentes em Compras Interestaduais:

ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços):

O ICMS é um tributo estadual que recai sobre a circulação de mercadorias e serviços. Em compras interestaduais, a incidência ocorre tanto no estado de origem quanto no estado de destino, com alíquotas variáveis conforme a legislação estadual.

Ao adquirir materiais diretamente da fábrica em outro estado, é possível que seja sua responsabilidade recolher o ICMS referente à entrada do produto no estado de destino. Isso pode envolver a diferença entre a alíquota interna e a interestadual.

O regime de substituição tributária pode ser aplicado, atribuindo a responsabilidade do recolhimento ao contribuinte substituto, muitas vezes o próprio fabricante.

A alíquota do ICMS varia de estado para estado no Brasil, impactando diretamente o custo de aquisição de materiais e equipamentos para obras. Para ilustrar como essa variação pode afetar o custo final de um equipamento e, consequentemente, o orçamento de uma obra, vamos considerar a compra de um equipamento cujo preço base é de R$100.000 em dois estados diferentes, um com alíquota de ICMS de 12% e outro com 18%.

Compra do Equipamento em um Estado com ICMS de 12%

Preço base do equipamento: R$100.000

ICMS (12%): R$12.000

Custo final do equipamento: R$112.000

Impacto no custo da obra: Nesse caso, o custo adicional devido ao ICMS é de R$12.000, aumentando o custo total de aquisição do equipamento para R$112.000. Se esse equipamento é essencial para a execução da obra, o aumento no custo de aquisição deve ser absorvido pelo orçamento geral do projeto.

Compra do Equipamento em um Estado com ICMS de 18%

Preço base do equipamento: R$100.000

ICMS (18%): R$18.000

Custo final do equipamento: R$118.000

Impacto no custo da obra: Com a alíquota de ICMS a 18%, o custo adicional sobe para R$18.000, elevando o custo total de aquisição do equipamento para R$118.000. Isso representa um impacto ainda maior no orçamento do projeto em comparação com a compra no estado com a alíquota de 12%.

Análise Comparativa e Implicações

Comparando ambos os cenários, a diferença no custo de aquisição do equipamento devido à variação da alíquota do ICMS é de R$6.000 (R$18.000 – R$12.000), o que demonstra como a localização da compra pode afetar significativamente o orçamento de uma obra.

Entender essas variações é crucial para o planejamento financeiro e a gestão de custos. Estratégias como adquirir equipamentos em estados com alíquotas de ICMS mais baixas podem oferecer economias significativas, especialmente em projetos de grande escala ou que exigem a compra de vários equipamentos caros.

Estratégias para Mitigação de Custos

Empresas que operam em múltiplos estados podem buscar adquirir materiais e equipamentos em regiões com alíquotas de ICMS mais vantajosas, sempre respeitando a legislação vigente sobre a circulação de mercadorias. Além disso, é importante considerar outros custos logísticos que podem surgir com essa estratégia, como transporte e seguro, para garantir que a economia com o ICMS não seja anulada por outros gastos adicionais.

A análise de custo-benefício, portanto, deve levar em conta todos esses fatores, além das possíveis implicações fiscais e operacionais, para determinar a melhor estratégia de compra e maximizar a eficiência orçamentária da obra.

Ainda existem algumas empresas que são isentas do ICMS. A isenção desse imposto refere-se a uma situação legalmente estabelecida em que determinadas operações ou produtos são dispensados da cobrança desse imposto. Isso significa que, sobre essas operações ou produtos específicos, não incidirá o ICMS, que é um dos principais tributos do sistema tributário brasileiro e incide sobre a circulação de mercadorias, serviços de transporte interestadual e intermunicipal, e serviços de comunicação.

Para que uma operação possa se beneficiar da isenção do ICMS, ela deve atender aos critérios específicos estabelecidos na legislação vigente, que pode variar entre os estados brasileiros, visto que o ICMS é um imposto estadual e cada estado tem autonomia para definir suas próprias regras e alíquotas, dentro de certos limites estabelecidos pela legislação federal e acordos entre os estados.

É importante notar que a isenção do ICMS é diferente da não incidência, da imunidade e da suspensão do imposto:

Não incidência: refere-se às situações em que a legislação não prevê a cobrança do ICMS.

Imunidade: é uma proibição constitucional da cobrança de impostos sobre determinadas operações.

Suspensão: é uma pausa temporária na cobrança do ICMS, com a expectativa de que o imposto venha a ser cobrado em um momento futuro, sob certas condições.

Empresas e contribuintes que se enquadram em situações de isenção do ICMS devem estar atentos à documentação e às obrigações acessórias específicas para garantir a correta aplicação do benefício fiscal e evitar problemas com a fiscalização tributária.

Para ilustrar o impacto do ICMS na compra de um equipamento de R$100.000 para dois clientes diferentes — um contribuinte de ICMS e outro não-contribuinte. 

Para este exemplo, vamos usar uma alíquota hipotética de 18%.

1. Cliente Contribuinte de ICMS:

Quando um cliente é contribuinte de ICMS, geralmente, ele pode se creditar do imposto pago na compra de mercadorias e equipamentos utilizados na sua atividade-fim. 

Isso significa que, embora o valor inicial do equipamento seja impactado pelo ICMS, esse imposto pode ser recuperado ou abatido dos impostos a recolher nas etapas subsequentes de sua operação comercial.

Valor do equipamento: R$100.000

ICMS (18%): R$18.000

Valor final com ICMS: R$118.000

Impacto financeiro: O cliente paga inicialmente R$118.000 pelo equipamento, mas pode se creditar dos R$18.000 de ICMS, utilizando esse valor para abater o ICMS a recolher em operações futuras. Portanto, o impacto real, considerando a recuperação do crédito de ICMS, volta a ser de R$100.000, assumindo que ele tenha ICMS a recolher em outras operações que permitam o aproveitamento deste crédito.

2. Cliente Não Contribuinte de ICMS:

Clientes não contribuintes de ICMS, como pessoas físicas ou empresas que realizam atividades isentas, não pagam nem se creditam de ICMS nas suas operações. Portanto, o valor do ICMS embutido na compra do equipamento representa um custo adicional que não pode ser recuperado.

Valor do equipamento: R$100.000

ICMS (18%): R$18.000

Valor final com ICMS: R$118.000

Impacto financeiro: O cliente paga R$118.000 pelo equipamento, e esse valor representa um custo final, já que não há mecanismo de recuperação ou crédito do ICMS pago. O ICMS efetivamente aumenta o custo do equipamento para o cliente não contribuinte.

O impacto financeiro do ICMS no orçamento de aquisição de um equipamento de R$100.000 varia significativamente se o comprador é um contribuinte de ICMS ou não. 

Para o contribuinte, o ICMS pode ser neutralizado por meio do crédito fiscal, enquanto para o não contribuinte, o imposto representa um aumento real no custo de aquisição do equipamento. 

É crucial que as empresas compreendam essa dinâmica para planejar corretamente seus investimentos e impacto no fluxo de caixa.

IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados):

O IPI é um tributo federal incidente sobre produtos industrializados. Em operações interestaduais, normalmente não é aplicado, mas é essencial verificar isenções ou reduções para os materiais específicos adquiridos.

Diferencial de Alíquota (DIFAL):

O DIFAL é um mecanismo de cobrança de ICMS em operações interestaduais destinadas a consumidores finais não contribuintes. Em algumas situações, pode ser necessário recolher o DIFAL, representando a diferença entre a alíquota interna e a interestadual.

Faturamento direto

O faturamento direto é uma prática comum na construção civil, oferecendo vantagens significativas na otimização de custos e na gestão fiscal eficiente. Essa prática envolve a compra de materiais e serviços diretamente pelo investidor do projeto, que então são fornecidos aos empreiteiros e subempreiteiros responsáveis pela execução da obra.

As principais vantagens em se realizar o faturamento direto são:

Redução de Custos com Impostos

Em uma operação sem faturamento direto, o empreiteiro compra os materiais e depois os repassa ao contratante, incluindo os custos indiretos e impostos como PIS, COFINS e ICMS no preço final. Com o faturamento direto, o contratante pode comprar os materiais diretamente, evitando a incidência de alguns impostos na cadeia, como o ICMS, que em algumas operações pode ser recuperado ou gerar crédito fiscal, dependendo do regime tributário do comprador.

Melhores Negociações na compra de volume

Grandes contratantes conseguem negociar preços mais vantajosos diretamente com fornecedores devido ao volume de compra. Se uma construtora está realizando uma grande obra e precisa comprar os cabos elétricos direto de uma fábrica, o preço por metro poderá ser significativamente menor do que se comprado por empreiteiros menores, devido à economia de escala.

Gestão Fiscal e Financeira Otimizada

Utilizando o faturamento direto, uma empresa que constrói uma nova planta industrial pode gerenciar melhor seu fluxo de caixa, planejando as compras de acordo com o cronograma de obra e aproveitando benefícios fiscais, como a acumulação de créditos de ICMS, que podem ser usados para abater outros tributos ou solicitar restituição.

Reduções de Taxas

  • Créditos de ICMS: Em alguns estados, o ICMS pago na compra de materiais para uso direto na construção civil pode gerar créditos fiscais. Isso é especialmente vantajoso para empresas enquadradas no regime de lucro real, que podem utilizar esses créditos para abater dívidas tributárias.
  • PIS/COFINS: Dependendo do regime tributário da empresa e da natureza das operações, pode haver reduções ou créditos referentes a PIS/COFINS sobre as aquisições de materiais e serviços utilizados diretamente na obra.

Embora o faturamento direto ofereça vantagens claras, especialmente em termos de economia fiscal e controle de qualidade, é essencial que as empresas estejam atentas às obrigações legais, documentações necessárias e gestão eficaz da cadeia de suprimentos para maximizar esses benefícios. 

A complexidade do sistema tributário brasileiro requer uma abordagem cuidadosa e planejada para evitar problemas fiscais e garantir que os benefícios do faturamento direto sejam plenamente aproveitados.

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